18/04/10

Privatizações e estagnação económica

Em The Portuguese Economy, Ricardo Reis aventa a hipótese das privatizações (ou, pelo menos, da forma como foram feitas) serem responsáveis pelo baixo crescimento económico da última década

O autor esclarece logo ao principio que não está a defender uma economia planificada cheia de empresas públicas, e imagino que ser linkado por um blogue como o Vias de Facto deva ser das últimas coisas que ele quereria....

33 comentários:

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro Miguel,
O autor avisa que a sua hipótese está por provar cientificamente, e coloca-a mais como uma pista para investigação do que uma verdade provada.
No entanto, o que faz a ligação entre o modelo de privatização descrito por ele e a estagnação económica verificada tem sólidos fundamentos na micro-economia, para além do problema ético que ele coloca e que parece cada vez mais presente.
Quando se privatiza antes de liberalizar o mercado, deve-se contar com a possibilidade de o proprietário privado da empresa monopolista fazer o que está ao seu alcance para impedir ou atrasar a liberalização e, assim, reduzir a concorrência.
E menor concorrência resulta sempre em menor criação de riqueza.
Se olhar para as economias europeias na segunda metade do Séc.XX não terá dificuldade em verificar que as economias de mercado com maior concorrência foram as que enriqueceram mais, e as que dificultaram (as ditaduras de direita) ou impediram (as ditaduras de esquerda) a livre concorrência foram as que empobreceram mais.

Anónimo disse...

Manuel Vilarinho:
Não jogo na equipa da social-democracia, mas arrisco, sem medo de falhar, a dizer que os países do norte da europa foram - e continuam a ser - aqueles que proporcionam melhor nível de vida ao cidadão médio. Não me venha dizer que eram os países cujos mercados tinham mais concorrência.

Aliás, os correios foram privatizados há uns anos na Suécia para mais tarde voltarem a ser nacionalizados.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro(a?) Anónimo,

Acho muito bem que investigue e tente perceber as razões das diferenças entre os níveis de riqueza dos países mais ricos e livres.
No entanto suponho que concordará que, até aonde conviveram em simultâneo na Europa sistemas diferentes, pode agrupar os países em escalões bem diferenciados pelo nível de riqueza, da seguinte forma:
1.Os mais pobres foram aqueles em que a concorrência não existia por natureza, os países comunistas;
2.O segundo grupo mais pobre foi constituído pelos países com ditaduras de direita em que a concorrência era condicionada;
3.O grupo de países mais ricos foi constituído por aqueles em que vigoravam economias de mercado e democracias.
E foi este facto que ditou a morte do comunismo, por bem intencionadas que parecessem as ideias que estavam na sua raiz.

A economia não é uma religião ou uma disciplina a que se adira por preferências clubísticas, é uma ciência, ciência humana necessariamente menos rigorosa que as ciências exactas, mas ciência, que procura perceber e explicar a realidade e não ditar como ela deveria ser.

Anónimo disse...

Manuel Vilarinho:
Ainda bem que divide o progresso nesses três escalões. Talvez seja levado a concluir que a Rússia czarista estava mais atrasada que o Portugal republicano e não foi o mercado muy livre que a colocou como segunda potência mundial. Talvez seja forçado a admitir também que existem muitas variáveis e que as várias equipas vão escolhendo as suas. Além disso a economia não é uma ciência exacta, e os seus últimos desenvolvimentos devem preocupar e mobilizar toda a população - essa coisa em voga de "sociedade civil" - no sentido de debater alternativas, consensos como o que V. diz, e mal, a "morte do comunismo".

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro(a?) Anónimo
Quando diz que a URSS se transformou na segunda potência mundial não está certamente a falar da liberdade e do bem-estar da população (e, já agora, na riqueza...), está a dizer que foi o segundo país a fazer bombas nucleares e o segundo que as tem em maior quantidade.
Vai-me desculpar certamente por eu não partilhar o seu entusiasmo pelo militarismo, e dar mais importância àquelas variáveis...
Até porque uma ditadura suficientemente sanguinária consegue fazer bombas nucleares ao mesmo tempo que a população morre de fome.
Veja a Coreia do Norte, por exemplo, que tem toda (toda? quase toda, para ser mais preciso, porque lá também se fazem colecções de Ferraris e Lamborghinis) a viver em indigência absoluta e tirania, mas está quase a conseguir ter bombas nucleares, e compare-a com a Coreia do Sul, que não as tem, mas tem milhões de pessoas a viver decentemente e em liberdade.
As minhas variáves não são essas, não... e também espero que não sejam as suas.
Quanto à "morte do comunismo", ele só sobrevive nos corações daqueles que continuam a sonhar e persistem em não acordar, porque nos daqueles que acordaram do pesadelo em que foram forçados a viver durante décadas está mesmo morto e enterrado.
Acho eu, mas se quiser saber mesmo o melhor é perguntar-lhes a eles.

Anónimo disse...

Caro Manuel Vilarinho:

Não partilho do entusiasmo imperialista de certa esquerda para com URSS, mas penso que não deve ser deixado cair no vazio a industrialização nos primórdios da URSS, cujo sucesso foi inegavelmente superior a qualquer outro país na altura - relembro-lhe a crise capitalista de 29, semelhante à dos nossos dias. Relegar o sucesso da economia soviética à importância da indústria de armamento ou do progresso no campo do nuclear é algo atroz. Do que estou a falar é de refazer o debate, entre economistas, das vantagens da planificação sobre o mercado, que continua a ter falhas graves. O que vejo diariamente é um debate monolítico, em que a maioria das populações se vê forçada a aceitar que de ano para ano se corte nas despesas de saúde e educação para reparar os excessos da finança.

Anónimo disse...

M. Vilarinho Pires- Por caso a Coreia do Sul não é bem o paraíso que nos pretende vender... É,tão-só, mais uma "colónia" americana, com mão-de-obra barata e um complexo de inferioridade muito grande em relação ao Japão, claro, por razões históricas. A crise dos finais dos anos 90 deixou muitas sequelas, apesar da recuperação ter sido fulminante por causa de grandes investimentos do Japão. A vida política e partidária é muito corrupta, com demissões célebres do PM e de vários ministros em 2008... Para lá do suicídio do antigo Presidente, Roh Moo-Huyun... No conjunto dos países membros da OCDE, a Coreia do Sul lidera a taxa de suicídios em contraponto com os índices de maior horário laboral, de menor descanso e do maior investimento na Educação( privada...), per-capita, no seio da Organização com sede em Paris. Niet

Anónimo disse...

E mais, Manuel Vilarinho:

Sou solidário com a sua atitude de indignação perante o facto de a Coreia do Norte ter Ferraris e Lamborghinis para as elites. Assim como estaria no passado, face aos países de "socialismo real", embora ache que o problema não seja o que merece a maior atenção. Veja que no mundo capitalista, sectores importantes salvos com dinheiros públicos como banca, seguros e outros mais têm os gestores a receber milhões. Não vejo em que possa diferir isso do aparelho burocrático do outro caso. Mas isso, diria, são "peanuts", porque se o valor desses bónus fosse distribuído pelo total da população toda de um país, não haveria diferença praticamente nenhuma (deixo o desafio desses números ao Miguel Madeira). O que importa discutir é: Para onde vai o Capitalismo?
"Quanto à "morte do comunismo", ele só sobrevive nos corações daqueles que continuam a sonhar e persistem em não acordar". É isso mesmo, o mercado não tem utopia, é uma grande desvantagem para os partidários de um realismo conformista que deixa à Direita as camadas da população mais responsáveis, lúcidas, cursados em economia pela escola de Chicago, etc e tal. Posso-lhe garantir que se fosse possível mostrar-me por A + B que o Capitalismo é superior ao Socialismo (ou deveria dizer os Capitalismos aos Socialismos?) não teria qualquer problema em abandonar as minhas crenças. Até lá...

Manuel Vilarinho Pires disse...

Meu(s) caro(s),
O problema do anonimato é que os comentários aparecem todos com o mesmo nome sem se perceber se são todos do mesmo comentador...
Pressuponhamos que não!

Caro(a?) anónimo nº1,
Ao que designa de capitalismo, eu prefiro designar de economia de mercado, já que houve sistemas capitalistas de economia bastante planificada.
Acreditar na economia de mercado tem uma exigência: sentir-se confortável com a liberdade (mesmo a dos outros).
Com a liberdade de criar empresas e exercer actividade económica, com a liberdade de os consumidores escolherem o que consomem de acordo com os seus critérios pessoais, mesmo que sejam egoístas, e a sua vontade, com a liberdade de todos fazerem o que lhes dá na gana, tendo como limite apenas o que colide com a liberdade de outros indivíduos.
Os comunistas sentem-se desconfortáveis com a ideia de uma economia a caminhar em roda livre, ao sabor das escolhas livres e egoístas dos indivíduos, receiam que o sistema possa ser capturado pelos mais poderosos com resultados catastróficos para os outros, e pensam que se pode fazer melhor planificando-a.
Tal como os puritanos se sentem desconfortáveis com a liberdade de costumes, receiam que conduza à desagregação da sociedade, e pensam que a imposição de padrões de comportamento "morais" pode salvar a sociedade.
Isto para dizer que não sei responder à pergunta "para onde vai o capitalismo?", porque irá para onde os agentes económicos o levarem, com algumas crises no caminho certamente...
Se me perguntasse, também lhe responderia que não sei para onde vai a sociedade que aceita o aborto ou o casamento homossexual, mas também que não estou nada preocupado com eles apesar de não ser utente, nem de um, nem do outro.
Concordo inteiramente com a sua crítica ao auxílio aos bancos em dificuldades, que foi em parte parar aos bolsos dos seus gestores, um exemplo de que a intervenção do estado, ou de "planificadores" na economia tem resultados preversos: devia-se ter deixado o mercado funcionar, mesmo à custa da falência dos bancos que tinham sido geridos de forma imprudente.

Caro(a?) anónimo nº2,
Acho louvável o humanismo que denota perante a triste sina do povo da Coreia do Sul, lebvando alguns a preferir a morte a tal sorte.
Mas como deve depreender do meu discurso liberal, considero sempre melhor uma opção que tenha sido tomada em liberdade a uma opção que tenha sido imposta por terceiros.
E o suicídio é uma opção voluntária, ao contrário de morrer de fome.
E, segundo creio, numa das Coreias morre-se de fome... mas está-se quase a ter uma bomba nuclear!

Anónimo disse...

M. Vilarinho: A taxa de suicídio- num país charneira entre o Japão e a China, do ponto de vsta económico- é extraor-di-na-ria!!! Trinta e cinco suícidios por dia. Caso surpreendente e que lidera no ranking da OCDE, a que a C. do Sul pertence. O que é que isto pode sinalizar? A violência da luta pela sobrevivência na " selva " do capitalismo monopolista atingiu o climax, por um lado; e por outro, a falência histórica, social e cultural da solução incarnada pelo sistema baseado na exploração do homem pelo homem e na privatização dos principais meios de produção. Tudo o que V. afasta com a ligeireza de um toque no teclado... Se bem o explicitá, não é ? Agora a perversão sistémica é colossal e sádica; onde a razão e a racionalidade se uniram para impedir a eclosão da plena democracia, que, segundo Castoriadis, ainda não existe à face da terra, pois, só surgirá desencadeada por uma " transformação radical daquilo que os humanos consideram como importante e sem-importância, como tendo validade e não a possuindo-em resumo, como uma transformação psiquíca e antropológica profunda, e com a criação paralela de novas formas de vida e de novas significações em todos os domínios ",in C. Labyrinthe II. Niet

Manuel Vilarinho Pires disse...

Pois, acredito que com "uma transformação psiquíca e antropológica profunda" os Coreanos do Sul ficassem mortinhos por partilhar o destino radioso dos do Norte que, "hélas", já tiveram a felicidade de viver essa transformação, mais a mal que bem...
Mas enquanto essa transformação milagrosa não chega, deixe-os lá viver as suas vidinhas em democracia e economia de mercado porque, como dizia o saudoso Georges Brassens, "...la vie est à peut prés leur seul luxe d'ici bas..."

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Manuel Vilarinho Pires,
parece-me haver uma contradição difícil de resolver entre a sua profissão de democracia e a sua sacralização daquilo a que chama a economia de mercado (suponho que livre-cambista, dada a sua desconfiança perante dispositivos de regulação).

Com efeito, tanto o modelo económico que tem em mente, como de resto qualquer outro, pressupõe certas condições institucionais e políticas para poder funcionar e impor-se. A esfera económica é sempre definida e instaurada por um poder político e institucional - e varia com as transformações que este sofre.
A própria "autonomia sistémica" da economia - a "desincrustação" do mercado de considerações e regulações éticas e políticas, como diria Karl Polanyi - é politicamente instituída.
Aliás, por isso mesmo, os clássicos falavam de "economia política".
Sendo assim, de um ponto de vista democrático, compete ao poder político democrático - quer dizer exercido pelos cidadãos organizados - a direcção da economia e a sua legislação. Não podemos democratizar o poder político - o exercício da política como a mais arquitectónica das artes - sem democratizar também, e no mesmo movimento, a actividade económica, a discussão dos seus objectivos, o modo como assegura a provisão dos mercados e nestes a "soberania" do consumidor. Nomeadamente, e para citar dois pontos simples, não vejo como impedir a deliberação e decisão democráticas de excluir a força de trabalho da condição de mercadoria e de conduzir uma política de democratização do mercado provisor dos outros bens (e decidir ainda que bens podem ou não ser providos pelo mercado) que confira a cada cidadão o equivalente, com os ajustamentos necessários, a um voto por cabeça (impedindo entre outras coisas distorções e controles oligárquicos do mesmo mercado).
A menos que você diga que a democracia deve ser limitada pelo esplendor da verdade da ciência económica, imposta esta por um Estado acima dos que governa, um pouco como o Papa acha que a democracia deve ser limitada pelas leis naturais justamente interpretadas pela doutrina e iluminadas pela Revelação. Mas uma democracia que não decide em matéria fundamental não é democrática.

Ou não será assim.

Cordiais saudações democratizantes

msp

Anónimo disse...

Caro MS Pereira e todos em geral: É nestes debates- aparentemente anódinos e sem repercussåo- que se cinzela a teoria...revolucionária autonomista. Autonomia como proposta e aposta política, como perspectiva de auto-transformação da sociedade. " Questão: quando é que um período revolucionário arranca? Resposta: quando a população constitui/forma os seus próprios orgãos autónomos- quando entra em movimento para atribuir a si própria as suas formas de organização e as respectivas normas". Será que o eidos- a ideia- união da organização e do organizado - caminha para a abertura ontológica e revolucionária ditada pela acção? Tudo isto são questões duras, profundas e exaltantes lançadas por C. Castoriadis. E que se conjugam com o texto/comentário anterior. Niet

Manuel Vilarinho Pires disse...

Boa noite Miguel, saudações republicanas!
Dado a adiantado da hora vou sacrificar a qualidade da resposta à economia de escrita.

A economia de mercado assenta no respeito pela liberdade, e na boa informação.
Liberdade de exercício de actividade, liberdade de escolher como se entende, liberdade de ser altruista, liberdade de ser egoísta, mas não liberdade de atentar contra a vida, a liberdade ou o património dos outros.
Boa informação para cada agente, empresa ou consumidor, estar habilitado fazer as suas escolhas de acordo com os seus próprios interesses.
A economia explica de modo tão simples que até eu, que não sou economista, consigo entender, que se num mercado concorrencial as empresas tiverem liberdade de se estabelecer e de produzir como entenderem, procurando maximizar os seus lucros, e os consumidores estiverem informados sobre a oferta disponível e tiverem liberdade de adquirir o que entendem, se consegue maximizar o bem-estar global, sendo este definido como a soma do bem-estar dos consumidores, que é o valor que eles dão àquilo que adquirem (superior ao preço, ou não adquririam em liberdade), e do bem-estar das empresas, os seus lucros (positivos, ou não se manteriam em actividade em liberdade).
E esta maximização atinge-se sem qualquer coordenação económica, com cada consumidor e cada empresa a agir apenas de acordo com os seus interesses individuais.
Uma economia planificada poderia, se funcionasse de forma perfeita, atingir esse máximo de bem-estar global, mas não com as pessoas como são na realidade, umas altruistas mas outras egoístas, uma honestas mas outras desonestas.
Atá aqui, o Estado serve essencialmente para arbitrar os conflitos de interesses, como por exemplo, um indivíduo roubando outro ou forçando-o a escolher contra a sua vontade ou enganando-o para o induzir numa escolha que, com boa informação, ele não faria.

Se o mercado for monopolista, ou se tiver um grau de concorrência reduzido, o bem-estar global não é maximizado, porque a empresa monopolista maximiza o seu lucro vendendo sempre menos quantidade a um preço mais alto do que o preço de equilíbrio se houvesse concorrência.
Para impedir esta redução do bem-estar global, o Estado é chamado a impedir a formação de monopólios ou, quando se trata de monopólios naturais (actividades que são realizadas com maior eficácia se só houver um produtor), a impedi-los de funcionar no seu modo natural, de maximização do lucro.

...

Manuel Vilarinho Pires disse...

...

A Democracia também assenta no respeito pela liberdade, e na boa informação.
E como se pode articular a Democracia, e o exercício do poder democrático, com a Economia de Mercado?
É muito simples: se, e só se, a comunidade decide democraticamente ter uma economia de mercado, o poder político democrático deve deixar funcionar os agentes económicos sem interferência nos mercados concorrenciais, a não ser para exercer a arbitragem de conflitos de interesses, deve procurar impedir a formação de monopólios ou mercados muito concentrados e, quando isso não é possível, deve regular o funcionamento dos mercados de forma a que eles sejam impedidos de funcionar segundo a lógica natural dos monopólios.

Os dispositivos de regulação são essenciais nos mercados monopolistas ou tendencialmente monopolistas, porque permitem aumentar o bem-estar global, mas exercidos em mercados concorrenciais introduzem distorções que a economia demonstra que dissipam bem-estar global, ou seja, destroem riqueza.

O trabalho pode ser ou não visto como uma mercadoria, mas proponho que nos abstenhamos de fazer juízos de valor sobre a aparente indignidade do conceito, e o analizemos, fazendo então um juízo sobre o resultado.
A fixação do preço do trabalho pode ser feita através de equilíbrios de mercado, ou distorcida por mecanismos de regulação.
Os mecanismos de regulação tendem a assegurar que o preço não é demasiado baixo, protegendo aparentemente os trabalhadores.
Mas o aumento do preço do trabalho tem duas consequências: a redução da procura, porque há actividades que seriam lucrativas com um preço abaixo do regulado, mas deficitárias ao preço regulado e, portanto, não são exercidas; e a redução do bem-estar global, por via do aumento de preços derivado do aumento dos custos de produção.
O salário mínimo protege os trabalhadores mais frágeis, que o auferem, mas lança no desemprego os que são ainda mais frágeis, aqueles cujo posto de trabalho só seria sustentável com salários abaixo do salário mínimo.
Uma parte do desemprego deve-se à regulação do preço do trabalho.
Concedo que mesmo assim prefira o trabalho regulado ao trabalho mercadoria, mas não esteja absolutamente convicto de que o balanço global é positivo.

Não creio que depois desta explicação, por pouco clara que tenha sido, lhe continue a parecer que eu sou adepto da limitação da democracia aos limites iluminados de um Papa (ou de um Partido Comunista), ou da submissão do poder político ao poder económico, ou da ausência absoluta de regulação.
Creio sim que se uma comunidade escolhe democraticamente viver em economia de mercado, deve ter a possibilidade de viver em economia de mercado, e o poder político deve procurar cumprir essa escolha.
Assim como, se escolhesse democraticamente viver em socialismo ou mesmo em comunismo, ou até em fascismo, deveria igualmente ter a possibilidade de viver da forma que escolheu.
A minha preferência vai inegavelmente para a primeira destas hipóteses, também pelo que a ciência económica nos ensina àcerca da sua vantagem sobre os outros na criação de riqueza e bem-estar, mas essencialmente porque é o sistema mais genuinamente ligado à liberdade.
E eu ainda vivi 17 anos e 11 dias em ditadura...

Saudações liberais!

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Manuel,
não posso entrar na indicação, ainda que sumária, das razões que me levam a considerar que os seus pressupostos de base não se verificam, no que se refere à concorrência perfeita, à informação completa, ao equilíbrio auto-regulado do sistema, à possibilidade de imputar uma parte ou resultado definido e preciso aos diferentes "factores de produção" ou de justificar, em termos não arbitrários e que não se resumam a relações de força cristalizadas, as diferenças de remuneração dos agentes (do mesmo modo é impossível justificar o tratamento como mercadoria da força de trabalho, uma vez que o seu preço é, uma vez mais, determinado por relações de força, e porque o seu valor não é determinável), etc.
Mas, para abreviar razões, direi, como Keynes a Hayek, que, se você admite a necessidade de regulação política da economia - pois falar em regulação ética, como faz Francisco Sarsfield Cabral (ver post acima "O Último a Saber" do Ricardo Noronha) equivale ou a não dizer coisa nenhuma ou a instaurar e impor politicamente as normas reguladoras - então o que teremos de discutir são as formas, modos e propósitos dessa regulação.
Concordo em afirmar que, como escreve Robert Castel, "uma sociedade sem mercado seria, com efeito, (…) uma maneira de fazer sociedade (…) estruturada por relações de dominação implacáveis ou por relações de dependência paternalistas humilhantes". Mas tiro conclusões que se afastam um pouco das dele, na medida em que sustento que não basta afirmar a necessidade da intervenção de "uma forte presença" do "Estado de direito" (R.Castel, L'insécurité sociale, Paris, Seuil, 2003). E creio que formular a questão em termos de mais Estado ou menos Estado é enganadora. O poder político está sempre fortemente presente, que mais não seja porque o poder de decisão hierárquico que governa a actividade económica é de natureza política e institucional. O que se trata é de democratizar esse poder e de não excluir a cidadania activa que essa democratização pressupõe da esfera económica.
Como escreve Castoriadis: tendo presente que 1. "uma imputação rigorosa do produto aos diferentes 'factores' e 'unidades' de produção" é "uma ideia estritamente desprovida de sentido", e que isso 2. "destrói qualquer base de uma diferenciação dos rendimentos que não seja a das situações adquiridas e das relações de força (que hoje, objectivamente, governam a repartição do e dos rendimentos)"; 3. uma sociedade democrática não poderá deixar de democratizar o mercado e de adoptar uma política de igualização dos rendimentos, ao mesmo tempo que "não é concebível que institua o autogoverno (…) excluindo-o nas colectividades de produção [e de actividade económica em geral] (C. Castoriadis, Fait et à faire, Paris, Seuil, 1997).

A discussão continuará mais tarde, espero. Até lá, cordiais saudações republicanas

msp

Anónimo disse...

"Liberdade de exercício de actividade, liberdade de escolher como se entende, liberdade de ser altruista, liberdade de ser egoísta, mas não liberdade de atentar contra a vida, a liberdade ou o património dos outros."

Revolta-me ver a palavra "Liberdade" esvaziada por pessoas de diferentes credos. Deixemo-nos disso, pois cada "tribo", à sua maneira, defende a Liberdade. Ou e esquerda quando defende que as matérias-primas de um país devem ser controladas pelos seus cidadãos e não por multinacionais defende menos a liberdade que o Manuel Vilarinho, que defende a liberdade de exercício de actividade? Nesta perspectiva, a própria expressão Liberdade de Abril se esvazia na liberdade do voto para um parlamento burguês, que fica bastante aquém da superioridade de um sistema soviético.

E já agora, por que não há-de a Coreia do Norte (20 anos depois da queda da URSS, seu principal parceiro fornecedor de energia barata) ter direito a desenvolver a energia atómica, quando até em Portugal é uma questão que está a voltar a ser falada? Onde está a Liberdade de acesso a energia em condições semelhantes a países mais desenvolvidos?

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro Miguel,
Decididamente, nem eu nem o meu amigo temos o dom da economia de escrita...
Deixe-me procurar acompanhar algumas (poucas) das suas reflexões.

Os pressupostos teóricos de mercado perfeito não se verificam na prática, é verdade. Mesmo assim, os sistemas de economia de mercado têm tido resultados menos maus, permitindo à generalidade das populações viverem decentemente e em liberdade. Ao contrário dos sistemas comunistas que, ao não se verificarem os seus pressupostos, tiveram resultados terríveis, que parece só não serem perceptíveis por alguns dos nossos colegas comentadores "anónimos" que persistem em encontrar virtudes na Coreia do Norte.
Eu sou de opinião aliás que o factor chave do sucesso da economia de mercado no mundo actual é a sua resiliência a circunstâncias menos que ideais e a cidadãos com um grau de formação cívica menos que ideal. Funciona razoavelmente com o mundo tal como ele é, não necessita de uma utopia para funcionar.

O preço do trabalho é determinado por relações de força? Se assim é, e não por um equilíbrio de mercado entre a oferta e a procura, há distorções que destroem valor, como a que citei no comentário anterior.
Deixe-me dizer-lhe que comecei a carreira profissional na empresa talvez mais poderosa do mundo à época, a IBM nos anos 80, e a empresa pagava regiamente aos seus funcionários, com salários de início de carreira bem superiores aos de topo de carreira dos contratos colectivos de trabalho.
Creio que as empresas mais poderosas são normalmente as que pagam melhor...
Aquilo a que chama de relações de força, o que lhe confere uma carga de falta de liberdade nas decisões, não serão antes decisões tomadas em liberdade por agentes económicos que, com interesses diferentes, têm também interesses comuns, já que as empresas precisam de trabalhdores para ter lucros e os trabalhadores precisam de empresas para ganhar a vida?
Não condenemos a mercantilização do trabalho sem perceber se ela traz benefícios ou prejuízos.

Mais estado, menos estado.
Apesar de me ver a mim próprio como um (não vou usar ultra- porque suscitaria nos nossos leitores a sugestão errada de que me estaria a insultar a mim próprio) liberal, identifiquei-lhe áreas onde sem estado a economia de mercado não funciona.
Tembém lhe digo que considero absolutamente desnecessário o estado entregar a nossa correspondência ou transportar-nos de autocarro ou avião.
As funções que eu identifiquei como essenciais são funções de soberania, de estado forte, não de estado fraco. Mas também não são de estado-empresário, nem de estado-capitalista que parecem encantar a esquerda, apesar do manancial de velhacarias que sempre dele resultam, como as enumeradas pelo artigo que estamos a comentar.

Finalmente, hei-de voltar ao tema da regulação ética, onde vejo maior potencial do que o que parece sugerir, mas depois de ler o artigo do Dr. Saasfield Cabral qua ainda não li.

Os melhores cumprimentos,

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro(a?) anónimo nº3,
(creio que não é o anónimo nº1, que me parece viver neste planeta e neste século, nem o anónimo nº2, que me parece viver no Séc.XIX e no fim dos seus comentários parece escrever sistematicamente niet)
Já estou cansado do tema Coreia do Norte.
Se ainda não percebeu que é uma ditadura sanguinária e psicótica com culto de personalidade que só tem paralelo com a Alemanha de Hitler, não vale a pena eu tentar-lhe explicar, porque nunca conseguirei.
Nem que o meu conceito de liberdade é livre e honesto e meu, pelo que lhe concedo o poder de definir quem pode ou não pode usar a palavra "liberdade".

Anónimo disse...

" Os indivíduos que a sociedade actual fabrica não a conseguem reproduzir ad infinitum; ou, para o dizer de outra forma, se tudo é vendável, o capitalismo não pode funcionar mais ". C. Castoriadis. C. Labyrinthe V. Edit. Du Seuil.

M.Vilarinho Pires: Sem os pensadores do séc.XIX- escritores,filósofos e cientistas-não havia Vida, História e Sociedade, Hoje.Eu tenho o meu " nicho " de ideias e conceitos- de transformação e praxis política e filosófica. E jogo cerrado nesse espaço exaltante, muito difícil e quase paradoxal.Não perca uma leitura da Comuna do blogue " Cinco Dias ",que se desenrolou entre Novembro 09 e finais de Fevereiro do corrente ano!Como economista liberal, fico a aguardar análises suas sobre o colapso sistémico do turbo-capitalismo! Bom vento! Niet

Anónimo disse...

Desafio o Manuel Vilarinho a encontrar a minha veneração pela Coreia do Norte. Ou não leu, ou não entendeu o que eu quis dizer, que foi uma condenação clara.

Deixe-me dizer-lhe que sou socialista e acredito na meritocracia. Com certeza sabia que nos países socialistas os salários não eram todos iguais, nem é algo que figure em nenhuma das bíblias marxistas-leninistas… Mas falando em diferenças salariais, os benefícios podiam ser entregues, em parte, em bens não mercantilizáveis para os que melhores resultados obtêm no seu trabalho: mais tempo de férias, ou possibilidade de redução do horário de trabalho. Coisa que a economia de mercado, cega e sujeita a forças que não controlamos, não tem promovido, bem pelo contrário, por acção da globalização da economia que traz a competir assalariados de países muito mais pobres e que não têm a possibilidade de reivindicar (e aqui, ou V. aceita proteccionismos, ou arrisca-se a que o mercado global baixe o nível de vida do seu país, ou não o faça melhorar o desejável).

Agora, não vou ser irrealista e pensar que é nas socialistas Cuba ou Coreia do Norte que há condições que possibilitam uma mudança do género, mas pergunto-me: poderão ser as capitalistas Argentina ou Índia? Repare que no pós-revolução de Outubro todo o socialista que se prezasse era suficientemente lúcido para perceber que o Socialismo só avançaria caso os países mais avançados (maior acumulação) fizessem as suas revoluções. Quer dizer, comparemos o comparável, digamos, a India capitalista com a China "comunista" e responda-me qual resolveu mais depressa os problemas básicos à maioria da população.

E repare que não estou a falar de superioridade da ideologia socialista sobre o capitalismo fora do ramo da economia.

A nível ecológico, o socialismo pode ser bastante superior (o que não acontecia, na realidade, na URSS), porque como sabe o capitalismo é terrível a incorporar externalidades; no que toca a poluição V. também defende menos regulação?

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro anónimo nº2, ou "niet" (para simplificar)

Acho muito bem que ande encantado com os seus pensadores do Séc.XIX.
Mas talvez valha a pena passar uma vista de olhos pelo Séc.XX para perceber como funcionaram na realidade os sonhos deles, pesadelos de milhões.
E dizer que sem eles não haveria "Vida, História e Sociedade, Hoje" parece-me um bocado exagerado...

A sua profecia de colapso do capitalismo não me enche de terror, como não me enchem de terror as profecias de colapso da sociedade que amigos meus que são "Opus Dei" teimam em associar ao divórcio, ao aborto e à legalização dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo.
São meras (e muito humanas) manifestações de desconforto perante a incógnita que sempre está associada a ver o mundo evoluir em liberdade, e consequentemente sem rumo definido, em vez de evoluir de forma determinística em função do sonho de um pensador ou da vontade de uma divindade.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro anónimo de nº indeterminado,

Se quer evitar ser confundido com os outros "anónimos"s, sugiro-lhe que arranje um nome.
Eu só comecei a usar estas "redes sociais" há manos de 2 meses, e não gastei mais de 5 minutos a arranjar um nome.

LF disse...

Fui eu que escrevi da última vez como anónimo (aliás, ou o único anónimo além do niet). Deixe-me dizer que estou a achar o debate desta caixa de comentários bastante frutífero, pelo que gostaria que reflectisse um pouco no meu último comentário, agora que também já tenho nome.

Anónimo disse...

M. Vilarinho Pires: Sempre na brecha, sempre na frente do diálogo e da descoberta:Estamos quase a molda-lo em liberal de esquerda! É esse o meu desejo e, creia,que isso vai ser possível...
O essencial reside nesta posição ética e estéctica: não há duas experiências humanas iguais, singulares ou sobrepostas.Mas há um instinto de verdade, como dizia o Bakounine.E isso contraria todas as falsas manobras de vaidade ou de prosápia. As dificuldades de ser leal, correcto e anti-herói são, pois, imensas. Portanto, há que respeitar certas regras do jogo e avançar- no meu caso- em direcção da Revolução Social em prol dos Conselhos Operários!
E agora para ver como nos projectamos no ilimitado,na diáspora de uma multiplicidade de afectos e conceitos, tenho o prazer de lhe fazer ver um flash monumental de uma entrevista entre Sartre e Benny Lévy: " Sartre: As minhas reacções aos meus trabalhos de filosofia foram sempre duplas: tinha a ideia que realizava uma farça. Mas, por outro lado, que visava a verdade( certo, com erros...). B. Lévy: Como para demonstrar que, filosofar como Hegel depois de Hegel, é sempre fazer uma farça. Sartre: Sim, de qualquer modo ". Salut et égalité! Niet

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro LF,
Reflicto concerteza, se bem que não tenha a certeza que as minhas reflexões lhe possam ser úteis ou esclarecedoras.
E não foi o facto de ser anónimo que me levou a não responder, como pode comprovar com a vastíssima troca de comentários que aqui fiz com anónimos.
Suscita sim o risco de confusão de respostas entre comentadores diferentes mas homónimos.
Como dizia o outro, os Lusíadas não foram escritos por Luís de Camões, mas por outro homem com o mesmo nome...
Reflitamos então.

Começemos pelo fim: não é o socialismo, nem o capitalismo, que defendem a ecologia. É a democracia, associada à impopularidade da poluição, que impelem os poderes políticos eleitos a legislar para proteger o ambiente, para continuarem a ser eleitos. Ou, dizendo o mesmo por outras palavras, é a concorrência entre candidatos ao poder político que defende o ambiente. É a política de mercado.

Juntando os seus comentários todos, faz de facto alguma crítica à Coreia do Norte.
Mas confundir a tentativa de desenvolvimento de uma arma nuclear, complementada com ensaios de mísseis com capacidade para a transportar, com uma tentativa de resolver os problemas energéticos causados pelo mais feroz isolamento do mundo actual, única forma de impedir a implosão da tirania que a governa, parece-me pouco elaborado.

Os países que eu conheço que concedem horários de trabalho mais simpáticos ou períodos de férias mais prolongados são os países mais ricos da Europa.
Se isso será sustentável ou não face à globalização, o futuro dirá.
Eu creio que não.
Hoje em dia voltou a estar na moda construir muros. Suponho que servem mais para esconder os problemas que para os resolver...
O que não é sustentável não se pode sustentar, por agradável que fosse essa possibilidade.

Os socialistas mais lúcidos sabiam que o socialismo "só avançaria caso os países mais avançados (maior acumulação) fizessem as suas revoluções".
E não é que era verdade?
Mas talvez não pelas razões que a sua lucidez lhes ditava.
Sabe porque é que o comunismo morreu? Porque, não tendo conseguido exportar a revolução para todos os países, tinha ao lado vizinhos com regimes diferentes onde se vivia muito melhor e com muito mais liberdade.
E, se é óptimo não ir ao McDonalds porque não se quer, é péssimo não ir ao McDonalds porque não se pode.
E, em o povo dos países comunistas ter percebido isso, não houve arsenal nuclear que impedisse a desagregação do comunismo. Nem muros.
Cumprimentos,

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro Niet,
Vamos ver se fechamos este diálogo, não porque não tenha sido ou não continue a ser interessante, mas porque se torna cansativo ao escrever uma resposta andar a pescorrer todo o longo "post" para a frente e para trás... mas concedo-lhe a última palavra, use-a como entender.

Se liberal é alguém que dá crédito a todas as soluções que advenham do exercício, em todos os domínios da vida, de decisões em liberdade por indivíduos que, ao tomá-las, não prejudiquem outros, nem a sua possibilidade de igualmente tomar decisões em liberdade, sou um liberal.
Não vale a pena gastar o seu tempo a tentar moldar-me para o que já sou.

De esquerda, não sei o que significa.
Não consigo ver a esquerda, na melhor das hipóteses, como mais do que o lugar aonde se revêem indivíduos bem intencionados que viram aquilo em que acreditavam desagregar-se, mas continuam a ter pudor em dar razão aos que acreditavam noutras coisas, por continuarem a acreditar que eram menos bem intencionados do que eles.
Misturados com outros, mal intencionados, que se deixaram inebriar pela ilusão de que um dia haveriam de tomar o poder, por ser isso o seu grande objectivo.
Ou seja o lugar aonde, a olhar para a bandeira enganadora da "egalité", se juntam os amigos da "fraternité" com os inimigos da "liberté".
Por muita simpatia que nutra por uns, ainda que enganados, nutro uma absoluta antipatia pelos outros, mesmo, ou ainda mais, os que manhosamente tenham mudado de campo.
Por isso, não vale a pena gastar o seu tempo a tentar moldar-me para o que nunca serei.

PS: Eu tenho 53 anos, vivi a adolescência num tempo em que havia ditaduras de direita, e também havia ditaduras de esquerda, mas as primeiras eram-nos muito mais importantes, até por viver numa delas; os jovens hoje em dia podem ver ditaduras de esquerda, mas tenho grande dificuldade em vislumbrar uma única ditadura de direita no mundo actual (ajude-me, se conhecer alguma); que contribuição é que acha que este facto vai dar para a sua formação cívica?

LF disse...

Bom, vou dar a minha última palavra, também, já que este tópico é chão que já deu uvas (das boas) e se afastou do post propriamente dito, para viajar no tempo e no espaço.

O meu último comentário prende-se com a necessidade que os Estados tiveram de salvar a Economia, tomando medidas proteccionistas, o que certamente desagradou ao nosso amigo liberal Manuel Vilarinho Pires. Já li mais do que um texto - mas não asseguro a fiabilidade dos mesmos - onde se afirma que se os EUA não tratassem de injectar somas absurdas, por exemplo no Goldman Sachs, a economia global poderia pura e simplesmente ter colapsado. É a partir daqui que eu penso ser necessário relançar o debate sobre a economia planificada (não excluindo, claro está, mecanismos de mercado) sob forma de alterar radicalmente o capitalismo e rumar ao socialismo. Isto não será possível se as faculdades de economia continuarem a formar pessoas com palas. Como vê, meu caro, a Liberdade não passa necessariamente pelo pluralismo necessário para resolver incendiar o debate em torno das questões realmente importantes.

Os melhores cumprimentos.

Miguel Madeira disse...

"mas tenho grande dificuldade em vislumbrar uma única ditadura de direita no mundo actual (ajude-me, se conhecer alguma)"

Monarquias absolutas contam?

E penso que, pelo menos, a Rússia e o Irão podem contar como "ditaduras de direita" (na variante Deus-Pátria-Família, não na variante "Nato e mercado livre").

Mas o conceito de "direita" é algo bastante indefinido (muito mais indefinido do que o de "esquerda", aliás), o que pode tornar polémico a classificação do que é de direita ou não.

Manuel Vilarinho Pires disse...

Caro LF,
Não gosto de voltar atrás com uma decisão que até já tinha anunciado, mas é-me irresistível deixar uma pequena observação ao seu comentário.
Acredita que a intervenção do Governo dos EUA nos bancos com a justificação do "risco sistémico" foi crucial para salvar a economia.
E eu não domino o assunto de forma a atrever-me a apoiá-lo ou desmenti-lo.
Mas em Portugal houve 2 bancos com problemas: o BPN porque tinha sido usado como instrumento para fazer negociatas por políticos de um dos partidos do "bloco central"; e o BPP porque tinha jogado no casino o dinheiro dos depositantes.
O Governo, agora do outro partido do bloco central, decidiu salvar o BPN com a mesma justificação, do "risco sistémico", e deixar cair os depositantes do BPP.
Acredita mesmo que se o Governo tivesse deixado o mercado funcionar e o BPN falir, Portugal, a economia portuguesa e o sistema financeiro português hoje estariam em pior estado?
Boa noite.

Anónimo disse...

Caríssimo MV. Pires: Correu tudo bem. Ultrapassámos pontos mais polémicos. Com fair-play e visão/ conhecimento da complexidade das questões decisivas sobre o Poder e a Economia, a Sociedade e a Revolução. Keep on line for the while! Salut et égalité ! Niet

Manuel Vilarinho Pires disse...

Pode sim, distracção minha, e alguma fadiga de andar a percorrer o "post" acima e abaixo vezes sem conta, de que lhe agradeço ter feito a correcção.
Uma boa parte dos países árabes são ditaduras de direita.
As monarquias absolutas são ditaduras sem qualquer dúvida, e muito do que digo sobre a Coreia do Norte não é mais do que um reflexo disso.
A Rússia é uma democracia.
E agora peço-vos desculpa por, finalmente, ir fazer o-ó...
Cumprimentos a todos e obrigado pela interessante troca de ideias

Miguel Madeira disse...

Acerca da Rússia - o meu critério foi contar como ditaduras todos os países "azuis" deste quadro [pdf].

Aliás, foi por isso que não incluí Singapura (que costuma ser o exe,plo clássico do capitalismo autoritário (está a amarelo)