23/02/11

É impossível uma sublevação popular derrotar um exército nas ruas?



Se os militares rebeldes esperavam resolver a questão com um pronunciamiento rápido e sem muito derramamento de sangue, à maneira do século XIX, foram surpreendidos pelo nível de mobilização ideológica da sociedade espanhola da época: de modo geral, exceto em casos isolados, os militares triunfaram nas regiões onde a direita havia sido mais votada em fevereiro de 1936, enquanto a esquerda - principalmente pela ação das milícias armadas socialistas, comunistas e anarquistas - vence nas regiões onde havia sido mais votada a Frente Popular: em Madrid e Barcelona, a insurreição foi esmagada quase que imediatamente.
Guerra civil espanhola

9 comentários:

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Possível é, mas quando a sublevação é do exército e não da população. Uma população desarmada que não tenha possibilidade de rapidamente encontrar armas e dispor de alguns elementos do exército contrário, tem muita dificuldade em vencer. É preciso também não esquecer que a população que defendeu a República não estava desarmada ideologicamente e tinha por trás fortes organizações políticas e sindicais. Não se tinha libertado, como neste blog se tem defendido, da burocracia sindical e política.

Miguel Madeira disse...

Uma cyber-discussão em que participei em tempos sobre isso:

>http://www.poliblogger.com/?p=16033

Miguel Serras Pereira disse...

Caro JNF,

…"Não se tinha libertado, como neste blog se tem defendido, da burocracia sindical e política".
Não posso crer no que leio, porque não quero crer que o Jorge não distinga entre "organização" (sem a qual não há democracia concebível) e "burocracia" (que é uma forma, variada, de organização hierárquica e de classe, que procura garantir a impossibilidade da democracia).

Li mal? Foi você que se exprimiu menos bem?

Saudações democráticas

msp

Ricardo Noronha disse...

Em muitos sítios, incluindo Barcelona, as armas utilizadas para combater o levantamento foram subtraídas ao exército. Só um dia depois de tudo ter começado e quando já se combatia rua a rua é que o governo resolveu distribuir armas pela população. É preciso dizer Jorge, que parte dessas organizações partidárias e sindicais também tinham as suas armas e milícias próprias, não estavam apenas armadas "ideologicamente". E que a burocracia sindical da UGT de então não tinha grande coisa que ver com a da CGTP de agora. Na CNT não existia burocracia sindical, os únicos remunerados eram os porteiros das sedes.
Continua a ser verdade Jorge, que num combate que é simultaneamente político e militar, uma sublevação popular pode vencer um exército. Não são as armas que matam, mas as pessoas que disparam essas armas.

Anónimo disse...

"Na CNT não existia burocracia sindical, os únicos remunerados eram os porteiros das sedes."

ah, ah, ah, ah! Homem: os sindicalistas da CNT, logo que puderam, entraram para o governo.

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Resposta ao Ricardo Noronha

Eu não disse que tinha sido o Governo que distribuiu as armas, até porque esse, que não fez nada, caiu um ou dois dias depois. Mas que foi possível subtrai-las ao exército foi. Por outro lado, dada a situação que então se vivia, os partidos de esquerda já dispunham de algum armamento. Mas vem tudo isto a propósito, de que de mãos vazias é que não se pode afrontar um exército. E mais sem qualquer organização sindical e política de esquerda então é muito mais difícil. Por isso fazer comparações com a Espanha da Frente Popular e da República nas vésperas do golpe fascista e o que se passa no mundo árabe e mesmo, se se quiser, com o que está a acontecer hoje na Grécia é descabido.
Quanto ao Miguel Madeira e Serras Pereira remeto para um post que hoje vou pôr no meu blog http://trix-nitrix.blogspot.com/

Anónimo disse...

La CNT fracasó contra la policía y el ejército en las insurrecciones de 1932, 1933 y 1934, eso que en esta última ocasión contó con la participación de la UGT. En 1936 triunfó porque el Ejército estaba dividido por el golpe: 1/3 sublevado, 1/3 paralizado y 1/3 claramente del lado de "la república". En Barcelona hubo tropas, guardias de asalto y guardias civiles compartiendo el mismo lado de la barricada con los anarquistas. No creo que el ejemplo de RN sea 100% adecuado para su tesis.

Miguel Serras Pereira disse...

Caro JNF,
lido o post que publicou no seiu blogue, retomo aqui o comentário que deixei na respectiva caixa dos ditos.


Caro Jorge NF,

embora nem sempre pelas mesmas razões precisas, partilho do seu relativo cepticismo - como deixei bem claro nalgumas das coisas que escrevi no Vias. Ou não será "cepticismo" a palavra mais correcta, mas o certo é que não devemos procurar satisfações substitutivas ou compensações para a nossa limitada capacidade de intervenção política mitificando revoltas que nem sequer soubemos prever.

De qualquer modo, são de saudar todas as conquistas de direitos políticos e sociais que estes movimentos permitam ou sejam capazes de visar. E não devemos, a pretexto de sobriedade, estabelecer limites a priori aos processos em curso. E que terão, talvez, repercussões na UE, nos EUA e no conjunto do (mis ou menos) "bloco ocidental". Para já, parecem estar a impor uma reorientação da política externa norte-americana na região…
Triste, triste, é mesmo notar que a UE continua a não dar sinais de ter sequer vontade de existir através de uma intervenção autónoma no que se passa.

Saudações democráticas

msp

Ricardo Noronha disse...

Eu nunca falei de combater de mãos nuas. Para entrar no governo não é preciso ser um burocrata sindical, trata-se de duas coisas diferentes. E o exemplo não é efectivamente 100% adequado, mas nenhum exemplo é 100% adequado. Limito-me a dizer que os precedentes históricos existem.
De qualquer forma, tenho algumas dúvidas sobre os números dessa tripartição do exército. A minha fonte (http://en.wikipedia.org/wiki/Pierre_Brou%C3%A9) é um pouco mais cautelosa no domínio quantitativo, mas considera relativamente incontornável o peso da CNT nos combates em Barcelona, onde a Generalitat lhe ofereceu o poder integral logo a seguir à derrota do levantamento.