12/11/15

Revisão constitucional?

Rever a constituição no sentido de acabar com a regra de que o presidente não pode dissolver a Assembleia da República nos primeiros seis meses a seguir a uma eleição legislativa ia abrir caminho a que no futuro um presidente pudesse neutralizar o voto popular - ganham um partido que não quero? Dissolve-se o parlamento no dia a seguir? Volta a ganhar? Volta-se a dissolver! E assim durante meses ou anos (com o parlamento a reunir um dia ou dois de dois em dois meses e a ser imediatamente dissolvido), até o resultado corresponder aos desejos presidenciais.

Levando ao extremo, nem sei se um presidente que fosse acusado de cometer um crime no exercício de funções não se poderia safar usando esse expediente: nesses casos, é preciso que 1/5 dos deputados faça uma proposta de acusação contra o presidente e que essa proposta seja aprovada por 2/3, transitando a partir daí para o Supremo Tribunal. Mas e se o presidente à beira de ser acusado fosse dissolvendo permanentemente o parlamento de forma a nunca poder haver essa votação? Ok, admito que provavelmente demoraria alguns dias até o presidente poder dissolver o parlamento (até que teria que reunir o conselho de estado e isso tudo), dando tempo à AR para votar e mandar para o Suprema a acusação.

Pode-se dizer que há outros paises em que logo pouco depois de haver eleições o parlamento pode ser dissolvido e volta-se a fazer outra eleição (veja-se o caso grego de 2012, com eleições em maio e junho); mas esses são regimes parlamentares, em que o processo de formação do governo e de dissolução antecipada é largamente automático (p.ex., na Grécia após as eleições o líder do partido mais votado é encarregue de formar governo; se não conseguir passa ao líder do segundo mais votado; se este não conseguir passa ao terceiro; se este também não conseguir o parlamento é dissolvido) e em que portanto não há margem para um chefe de estado dissolver um parlamento recém-eleito só porque assim o decidiu (pondo de outra maneira - num sistema semi-presidencialista o presidente tem mais poderes que num sistema parlamentar, logo tem também que ter mais limites ao exercício desses poderes).

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