11/03/13

Sobre o "Rendimento Universal Garantido" (II)


[Continuação do tal texto escrito no principio do século]

Este capítulo entra um pouco na parte mais técnica da economia, mas permite entrar melhor dentro de certos aspectos mais subtis.

Uma das grandes questões da economia é o conflito entre “igualdade” e “eficiência”, ou seja, o facto que é difícil o Estado fazer políticas que tirem 50 contos a um rico e dêem 50 contos a um pobre: a maior parte dessas políticas acabam por tirar 60 contos ao rico e dar 40 ao pobre, gerando-se uma perda de “eficiência” de 20 contos (note-se que isto é apenas uma análise económica, não ética: muitos economistas de esquerda são da opinião que, mesmo que se perca 20 contos, vale a pena, por razões morais, fazer a redistribuição; pelo contrário, muitos economistas de direita são da opinião que a redistribuição é, em sim, moralmente errada, pelo que não deve ser feita, mesmo que não houvesse esta perda de eficiência).
Por que acontece esta perda de eficiência? Basicamente pela conjugação de dois factores: por um lado, quando o Estado cobra impostos de alguém, por regra, para obter 50 contos de impostos, o contribuinte, directa e indirectamente, perde mais de 50 contos. Ao mesmo tempo, quando o Estado “dá” 50 contos a alguém, quem os recebe, por norma, acaba por receber, directa e indirectamente, menos de 50 contos.

Deixando de lado a questão dos impostos, vamos analisar o de os beneficiários das medidas de protecção social “ganharem” menos do que o Estado gasta. Vamos supor que o Itelvino recebe 40 contos de RMG ou de SD, pode arranjar um emprego a ganhar 70 contos e o tempo livre dá-lhe um bem-estar equivalente a 35 contos. Nesta situação ele não irá aceitar o emprego, já que actualmente “ganha” 75 contos (os 40 mais os “35” que vale não fazer nada) e, de outra maneira, iria ganhar apenas 70 contos. Assim, concluímos que o RMG ou o SD “rendem” ao Itelvino 5 contos (os 75 contos que “ganha”, incluindo o tempo livre, menos os 70 que ganharia), enquanto que o Estado gasta 40 contos, ou seja, 35 contos evaporam-se como um cubo de gelo esquecido em cima de um fogão ligado (poderá argumentar-se que tanto o RMG como o SD têm mecanismos de fiscalização que impedem que alguém os recebe podendo arranjar emprego, mas, por um lado, a eficácia desses mecanismos é contestável, e, por outro, o próprio funcionamento desses mecanismos implica custos administrativos).
 
Vamos supor outra hipótese: que o Estado, em vez de dar dinheiro, fornece serviços públicos gratuitos. Vamos supor que, ao Itelvino dá-lhe um bem-estar equivalente a 25 contos usufruir de um desses serviços, e que fornecer-lhe este serviço custa ao Estado 30 contos – de novo uma perda, agora de 5 contos (se o Estado, em vez de fornecer o serviço gratuitamente, o vendesse, ao preço de 30 contos, o problema não se punha, já que só utilizaria esse serviço que realmente fosse ter um benefício que valesse mais que os 30 contos). No entanto, refira-se que em certas circunstâncias é “eficiente” que o Estado forneça serviços públicos gratuitos (além disso, mesmo que os serviços públicos gratuitos gerem ineficiências económicas, tal não significa que, no plano moral, não sejam desejáveis).
Aonde entra aqui o RUG? Muito simplesmente, é a única forma de assistência social, que, por si, não causa ineficiências: se o Estado pagar 15 contos a toda a gente, o aumento de bem-estar que tal gera nos seus beneficiários nunca é inferior a 15 contos. Vamos supor então que o Itelvino recebe 15 contos do Estado (se tivesse um filho a cargo, receberia 30). Tem três hipóteses: pode continuar a trabalhar ao mesmo ritmo do que antes, e aí ganha mais 15 contos (logo não há “perdas de eficiência” já que o seu benefício corresponde realmente ao 15 contos que o Estado gastou); pode trabalhar menos, de forma a continuar a ganhar, no total, o que ganhava antes, o que significa que para ele, o tempo livre que ganha “vale” mais do que 15 contos (se assim não fosse, ele preferiria ganhar mais, em vez de trabalhar menos), logo o seu bem-estar também tem um aumento maior que os 15 contos que foram gastos (portanto também não há perda de eficiência); ou pode optar por uma situação intermédia, ganhando mais e trabalhando menos (como facilmente se depreende, um meio-termo entre duas situações eficientes também será uma situação eficiente).

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